terça-feira, 19 de agosto de 2014

Mosteiro

Ontem fui a um mosteiro bastante importante para mim, uma vez que está ligado aos meus mestres Tibetanos , que tiveram a grande simpatia de acolherem Portugal nos seus destinos, para aí ensinarem de tempos a tempos. Para chegar até lá, as mesmas aventuras rotineiras de sempre: discutir o preço do taxi, o condutor não saber o caminho, o trânsito intenso, etc. O normal por estas bandas. Pelo menos não ia de mota, pensei. E ri-me sózinho recordando a aventura do dia anterior.
Depois de algumas peripécias, de termos ido para outro mosteiro, estradas de lama, algumas marcha-atrás perigosas,  lá chegámos ao pretendido. Apenas um senão: o enorme portão ( mas quando digo enorme é ENORME) estava fechado. Numa porta mais pequena ao lado, havia uma espécie de campaínha. Porém estava partida. Ali estava eu, á frente de um portão enorme,  a bater com alguma força, a tentar,  com todos os meus quereres, entrar. Tenho de acrescentar que, do portão até ao interior do mosteiro, ainda havia uma distância considerável. E como tudo isto se passava no topo de uma montanha, a distância parecia aumentar. De vez em quando era ajudado pelo meu motorista de taxi que ia dando umas buzinadelas, ao portão. A imagem que tenho de mim é a de um desenho animado, muito pequenino, de um conto qualquer das mil e uma noites, á entrada da porta de um grande palácio, mas como plebeu, não o deixavam entrar. Passados uns momentos, conformei-me que a viagem tinha sido em vão e comecei a entrar no taxi. Nisto, juro-vos, pareceu-me ver a silhueta de um homem, por detrás das frinchas do portão, a descer a rua. Saí do taxi, chamei-o ansiosamente. Ele sempre calmo, cumprimentou-me, perguntou-me de onde vinha. Quando lhe falei nos mestres que costumam ir a Portugal, o sorriso tornou-se maior e apenas disse um simples "por favor, entra!". Assim o fiz, despedindo-me do taxista. O portão voltou a fechar. Eu estava no mosteiro. A partir daqui tenho de assumir o meu falhanço em contar o que quer que seja, pois tudo ficou para além das palavras. Apenas digo que passei parte do dia em recolhimento silencioso, em retiro. Em meditação. Lá em baixo Kathmandu parecia distante, muito pequenino. Cá em cima o ar estava fresco. E o silêncio... o silêncio era maior do que dez portões de cinquenta mosteiros em cima de cem altas montanhas. O silêncio poderia muito bem morar num qualquer conto de mil e uma noites. Ao fim da tarde desci da montanha, apanhei um autocarro, regressei a Kathmandu. Mas á noite eu ainda trazia a montanha dentro de mim, ainda estava no mosteiro, ainda tinha comigo o atravessar do grande portão.  Ainda tinha o silêncio. E não tinha sido nenhum conto de mil e uma noites. De vez em quando esta viagem grande que é a vida, leva-nos para outros lugares que não contamos. Por vezes até  altera a geografia dos mapas que julgamos conhecer no interior de nós mesmos. E noutras vezes até achamos que contos de mil e uma noites e outros afins, são uma realidade tão real como a que conhecemos. 
Ao passear pela noite senti-me bem. Talvez seja isto a que chamam paz.

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